[Crônica] Favoritismos - 09.04.2020
Podemos entrar em qualquer conversa em aplicativos de mensagens que
encontraremos uma pergunta em todos — aqui estendo minhas mãos
para receber as algemas da culpa, pois eu mesmo tenho essa prática
com demasiada frequência — que é “qual a(o) sua(eu) (insira
aqui qualquer coisa) favorita(o)?”; isso como uma pobre tentativa
de conhecimento íntimo da pessoa com quem se conversa, imaginando
que isso ajudará a estreitar os laços.
Recentemente andei refletindo acerca da natureza do favoritismo.
Usando de uma analogia, ter algo favorita é ter algo pelo qual você
trapacearia para que ele ganhasse em uma competição.
Essas reflexões me vieram à mente quando entrei em um aplicativo de
dicionário para pesquisar o significado da palavra malthusiano,
a qual havia lido no livro de crônicas de Guilherme de Almeida.
Enquanto estava na página do dicionário dedicada a essa palavra —
e depois de dar uma rápida olhada em todas aquelas informações que
desconheço a utilidade, como quais são as consoantes ou como a
palavra fica quando escrita de trás para frente — pude ver que
havia um botão para favoritar aquela palavra, assim como deveria
haver em todas as outras sem que eu notasse. Passei alguns segundos
olhando para o botão e me indagando se malthusiano
era digno dessa condecoração de palavra favorita
e de tanto cavucar, cheguei a um questionamento ainda mais basal.
Quais são os critérios para uma palavra ser considerada uma das
suas favoritas? O que tem de agradar? Na comida é o sabor. Na música
é a letra e a melodia. E nas palavras? Seria o significado — uma
palavra que tivesse o significado bonito ou até mesmo poético? A
sonoridade — que poderia ser considerado
até
mesmo o sabor das palavras? O
quanto você a utiliza no dia a dia — se for esse o critério,
conheço algumas pessoas com palavras que são favoritas até demais?
Uma média aritmética entre os três?
Por fim, não favoritei e saí do
aplicativo. Escolherei minhas favoritas quando tiver com paciência
para fazer uma planilha do Excel
e estiver com minha calculadora científica ao meu lado.
Gabriel Nunes
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