Postagens

Mostrando postagens de setembro, 2019

18 de Setembro de 2019; Quarta-Feira

O homem, ao saber que seria submetido à uma cirurgia complicadíssima, sobre a qual dava para sentir a desesperança dos médicos ao falar sobre sua condição, fez uma promessa à Nossa Senhora, sua mãezinha. Se saísse ileso dessa maluquice de cortes, transfusões e bisturis, seria o homem mais caridoso da face da terra, ajudando a todos que pudesse, sem pestanejar e de bom coração. Aconteceu porém o que ele não contava. Sobreviveu e se viu em dívida com a boa senhora que sorria na igreja a olhá-lo de cima para baixo. Logo que recebeu alta no hospital, saiu sedento por qualquer coisa que possuísse traços de sal, diferente da maldita comida insossa da casa de saúde que estava deixando. Se visse mais uma canja esbranquiçada e sem sabor na sua frente, seria capaz de ter um treco. Para sua sorte, sua filha, já sabendo que não poderia ficar para ver o pai ter alta, e sob insistência do próprio genitor, voltou para sua cidade, para a companhia do filho e do marido, deixando com o senhor ...

16 de Setembro de 2019

Recebo frequentemente na minha casa - que não é exatamente a minha casa, mas me refiro assim simplesmente por morar nela - inquilinos indesejados. Aquela tia que faz perguntas indiscretas; aquele primo que vem se escorar, em buscar de apoio para sua vida de vadiagem; ou simplesmente pessoas que nem são inquilinos, apenas visitas, mas que  sua mera presença se torna um estorvo. O que fazer em uma situação assim? Você, assim como eu fico, pode ficar constrangido de mandar que tais pessoas vão embora lhe devolvendo sua tão sonhada paz para apenas assistir sua Netflix em paz, sem ter que responder pela ducentésima vez que não está em nenhum relacionamento e que não tem nenhum dinheiro para emprestar. Se você for uma pessoa de sorte, mora sozinha em sua casa - ou apartamento, ou quitinete, ou barraco, ou ponte, ou coisa que valha - e tem sua privacidade a maior parte do tempo. Mas permita-me extrapolar sua casa para que ela seja seu bairro. Faça mais um esforço e extrapole para sua ...

11 de Setembro de 2019

Um fato que nos é duro de aceitar, mas que dia a dia nos é jogado na cara bem como as pedras eram atiradas em Estevão, é que a história é cíclica. Vemos acontecerem por aí coisas que eram comuns à décadas, ou até mesmo séculos atrás. Preconceitos absurdos, homofobia, ditaduras, mentiras que são tidas como verdades por caprichos de governantes. Alguns desses fatos, apesar de serem camuflados com uma aparência inofensiva, são como a tosse para uma tuberculose. Sintomas que se olhados isoladamente, por nossas mães ou pela rezadeira do seu bairro, nos deixariam tranquilos e com o pensamento de que não tínhamos nada mais grave que uma gripe, mas ao visitar um médico que nos dará o panorama total, veremos que estamos andando em uma corda bamba, em que dos dois lados fica a morte com as mandíbulas arreganhadas para nos devorar. Uma dessas tosses é a ascensão do mito da terra plana. Dizem eles, por meio de gráficos e diagramas, que é possível que a terra como conhecemos funcionaria da mesm...

09 de Setembro de 2019

Fatos que você recebe inesperadamente: dia 8 de setembro, ontem, foi o dia mundial da alfabetização. É engraçado (não é exatamente o termo que eu usaria, mas não pensei em nada melhor) que não há o que comemorar. Não a meu ver. Tivemos um índice de alfabetização crescente durante bastante tempo, mas parece que não foi muito eficaz, pois estamos lidando com as consequências de pessoas que não sabem interpretar um texto. Alfabetização não tem a ver com leitura. Ler - o ato de juntar letras em sílabas e sílabas em palavras -, por si só, é vazio. Palavras tem peso, tem densidade, e ao mesmo tempo tem leveza para saírem voando por aí, se esvoaçando como sementes de um dente de leão infindável. Alfabetização não é instrumento para formar peões que vão puxar alavancas e apertar botões, tendo suas vozes e pensamento suprimidos pelo barulho das máquinas e pelo gritos de guerra a um inimigo fantasioso, o fazendeiro se vestindo de lobo para acuar as ovelhas e deixá-las todas juntas. Alfab...

06 de Setembro de 2019

Nada explana melhor a alma humana do que o medo. Ele parece abrir nosso peito e mostrar tudo o que temos guardado ali para o mundo, como em uma tela de tv. Isso porque o medo é a emoção primal. A emoção que nos permitiu chegar até aqui, pois é nele que tomamos nossas reações mais acertadas - correr ou lutar. Ironicamente é o momento em que menos raciocinamos. Um exemplo disso aconteceu essa semana, em um bairro da Grande Fortaleza, mais precisamente o Alto Alegre. Onde, dentre as casa e comércios do lugar, não se imaginava o que acontecia em uma locação específica. Ali, como uma agulha em um palheiro, ou uma cobra em um matagal, animais estavam tendo suas vidas, inocentes e livres de culpa, jogadas no lixo. Isso porque em um abrigo da região, 180 animais, entre cães e gatos, estavam sofrendo maus tratos. Animais brigando entre si, passando fome e sede, doentes, cruzando indiscriminadamente, jogados pelos cantos, praticamente cadáveres em vida. Isso tudo foi denunciado à delegacia d...

03 de Setembro de 2019

Basta que você entre pelas portas (dianteiras na maior parte do tempo) dos ônibus da cidade de Fortaleza para identificar um ambiente opressor e ao mesmo tempo familiar. Eu que faço uma viagem de aproximadamente uma hora e meia de ônibus diariamente, fora as viagens extras para lazer, passo dois dias e meio por mês dentro de ônibus, isso segundo uma continha rápida (1,5 x 2 x 5 x 4/24). Não tem como não se acostumar ao ambiente. Atualmente, porém, algum desavisado pode acabar se assustando ao entrar no ônibus, dar bom dia para o motorista, dar bom dia para a senhorinha que senta todos os dias na cadeira amarela preferencial,  se virar para cumprimentar o trocador e encontrar uma cadeira vazia, com apenas a sua gaveta de dinheiro a juntar poeira. O nobre amigo pode até mesmo se preocupar com a saúde de seu tão familiar trocador, mas será em vão, pois perguntará por ele ao chauffeur e receberá a resposta que já deveria ter visto antes de entrar no ônibus, na forma de uma plac...

02 de Setembro de 2019

E stava caminhando pelas ruas de meu bairro com minha cadela de estimação. Moro em um subúrbio de Fortaleza e acabei entrando em uma rua de casas humildes (a quem estou tentando enganar, todas as casas aqui no meu bairro são humildes) e não pavimentada. No meio da rua um grupo de crianças brincava de bater umas nas outras com pedaços de isopor. Quando passei por elas eu vi que tinham se dividido em grupos. Mocinhos e bandidos. Sorri comigo mesmo ao ver aquilo, pois me lembrei de minha própria infância, quando brincava exatamente daquela forma com meus amigos. É engraçado como fatos simples levam a raciocínios que você nunca pensou ter. Tudo estava ali na sua mente, todas as peças para ter aquela ideia, mas precisava de um pontapé inicial. Juntando minhas memórias de infâncias, o jeito que minha mãe me tratava e as histórias de infância dela, percebi uma coisa. A afirmação de que "a infância está morrendo" é uma falácia. Só porque seu filho(a) passa o dia no ce...